Filho do Jogo - Episódio 04
"Filho do Jogo"
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CENA 01: (Casa de Rico. Sala. Interior. Noite.)
• Rico sentado no sofá, gemendo de dor enquanto Cátia cuida de suas feridas. Kelly e Paulão, muito assustados, limpam o sangue do chão.
CÁTIA (Furiosa): Ricardo, você vai ou não vai falar de uma vez por todas o porquê de tantas coisas estranhas estarem acontecendo, meu filho?!
RICO (Dor): Eu já te disse que não dá pra falar agora, mas você vai ver, eu ainda vou esclarecer tudo isso. O importante é que nada aconteceu com vocês!
KELLY (Incrédula): Como assim não aconteceu, Ricardo?! E o trauma que a gente vai carregar pra sempre, e o medo de sair na rua agora?!
RICO: Foi você quem apanhou, garota?!
KELLY: Não, mas foi a MINHA CASA que invadiram!
PAULÃO: Por favor, gente… esse é o pior momento pra brigar. Mas, Ricardo, meu filho, você precisa urgentemente rever essas confusões que você tá se metendo, porque não vai demorar muito pra que elas respinguem na nossa família. Arrombaram a porta da nossa casa!
CÁTIA: E isso tudo tá acontecendo desde que você se meteu num acidente com aquele bicheiro!
RICO: Tá desconfiada de alguma coisa envolvendo o tal bicheiro, mãe? O nome dele é Márcio Veiga de Oliveira, isso te lembra alguma coisa, por um acaso?
• Cátia estremece ao escutar o sobrenome “Veiga de Oliveira”.
CÁTIA: Eu?! Eu… não, não conheço.
• Ela termina de fazer os curativos e se retira apressadamente. Rico acompanha o trajeto dela, desconfiado.
KELLY: Por que você acha que a mamãe tem alguma coisa a ver com isso? Você tá ficando doente, Ricardo!
RICO: Esquece isso, tá, Kelly? O importante é que eu vou dar um jeito nessa bagunça.
CENA 02: (Comunidade. Beco. Interior. Noite.)
• Instrumental tenso. Pela noite escura, vemos dois pés calçados com botas pretas correndo. Foco para as botas sujas de sangue. Quando os pares de pés entram num beco iluminado apenas por um poste, a câmera vai subindo e revela-se ser Ruth a pessoa misteriosa, encapuzada. A roupa toda ensanguentada do serviço que acabou de realizar para Mauricéa. Ela joga a sua mochila no chão e troca as roupas de capanga pelas roupas de igreja, sem parecer ter arrependimento nenhum do que fez. Liga o celular e vê uma notificação: “Você recebeu uma transferência de R$100.000 de Mauricéa Veiga de Oliveira”. Respira fundo, satisfeita, e segue o seu caminho para casa.
CENA 03: (Casa Ruth. Sala. Interior.)
• Nadir cochila no sofá, deixando a TV ligada. Ruth adentra a casa e vê a cena. Sorri para a avó e se move com cautela para não acordá-la. Desliga a TV e as luzes e vai andando em passos leves para o banheiro, até que, para sua surpresa, uma das luzes se acende e, ao olhar para trás, é Nadir quem está do lado do interruptor.
NADIR (Desconfiada): Tu tá chegando em casa uma hora dessas por quê, Ruth?
• Ruth se vira, nervosa, e logo se faz de sonsa, inventando uma desculpa.
RUTH (Nervosa): Vovó, eu… estava na igreja! Hoje o grupo missionário de jovens tava arrumando lá pra celebração que vai ter amanhã.
NADIR (Desconfiada): Hum, entendi… e a senhorita veio sozinha, foi?
RUTH: Não, não… o varão Cléber me acompanhou até aqui.
NADIR: Cléber, sei… cuidado com esse aí, viu, você bem sabe como é baterista de igreja. Tá doido pra bater a baqueta em outro lugar…
RUTH: Vovó, tá repreendido! Até fico apavorada quando toca nesses assuntos… eu não quero conhecer o quero-quero ainda!
NADIR: Muito bem, mas já está na hora mesmo de encontrar um varão pra casar, hein…
RUTH (Rindo): Ah, eu ainda vou pensar nisso. É que agora estou num firme propósito com Jesus. E tô muito cansada… eu vou tomar um banho, tá bem? A bença, vó.
NADIR: Vai lá, meu amor, Deus abençoe.
• Ruth se retira. Nadir continua encarando a parede, desconfiada.
CENA 04: (Motel. Banheiro. Interior.)
• No banheiro do motel, Mauricéa e Batista se aprontam para sair dali. Mauricéa seca os cabelos em frente ao espelho, com uma expressão serena, leve. Batista no banho. O telefone de Mauricéa começa a tocar. É Ruth que liga. Mauricéa atende.
MAURICÉA: Querida, você me ligou num momento e num horário nada convencional, então espero que o que você tenha pra falar seja de extrema importância.
RUTH (Voz): Trabalho feito com sucesso, dona Mauricéa. Demos um apavoro no bastardo e na família dele.
• Mauricéa sorri, satisfeita.
MAURICÉA: Ótimo. Você já deve ter recebido a primeira parte do seu pagamento, não é? Vou fazer a segunda e ainda vai ser com um aumento porque você merece. Espero que esse estorvo nunca mais volte na minha vida…
RUTH (Voz): Obrigada, dona Mauricéa, e conta comigo pra qualquer coisa. Até a próxima! Foi ótimo fazer negócio com você…
MAURICÉA: Idem, benzinho…
• Mauricéa desliga e segue secando os cabelos. Batista, ao fundo, sai do banho e se enrola numa toalha. Se aproxima de Mauricéa, beijando o pescoço dela, seduzindo-a.
BATISTA (Baixinho, no ouvido dela): Tava resolvendo o que de tão importante que não foi tomar uma ducha com seu tourão aqui?
MAURICÉA (Sorrindo/Excitada): Tava resolvendo uns probleminhas de família e de jogo, mas creio que já tá tudo certo. Eu ainda fui muito boazinha nas escolhas que tomei.
BATISTA: E eu posso saber que escolhas foram essas?
MAURICÉA: Aqui a gente não fala de jogo, querido. A gente pode falar de qualquer outra coisa…
• Batista se aproxima. O pênis enrijecido marcando na toalha é notado por Mauricéa. O homem, excitado, carrega a mulher e a coloca em cima da grande pia do banheiro. Joga no chão tudo que há por cima, dando espaço apenas para Mauricéa. Eles se beijam, o clima pegando fogo. Corte rápido para as pernas de Mauricéa apoiadas nos ombros de Batista enquanto ele a penetra incansavelmente. A imagem se embaça à medida que a câmera se afasta dela…
CENA 05: (Mansão Avillar. Suíte Casal. Interior. Noite.)
• Ao som de “Angela Ro Ro - Na Cama”, vamos nos aproximando de um grande quarto luxuoso, iluminado apenas por um abajur aceso na bancada. Há uma mulher na cama, é Helena. Ela encara o teto, com olhar vago e sem conseguir pregar os olhos de forma alguma. Espalha-se pela grande cama de casal, mas se sente vazia sem a presença de Batista ao lado. Mil coisas passam pela cabeça dela, mas a mulher prefere acreditar que ele está resolvendo negócios na cúpula. Helena fecha os olhos e lembra da última vez, há tempos, que teve uma relação sexual com o marido. Flashes de Batista e Helena na cama, ele por cima, beijando o pescoço dela enquanto ela geme e arranha as suas costas. Helena pisca novamente e vê que aquilo não está mais acontecendo, mas ainda sente um leve arrepio ao lembrar como era bom. Ela agarra o travesseiro de Batista, ao seu lado, e começa a cheirá-lo, sentindo o perfume do homem. Mais flashes vêm à sua cabeça: Batista tirando a cueca em sua frente e indo em direção a ela. Helena solta um gemido desproposital ao lembrar daquilo. Começa a sentir calores estranhos para ela até então, porque de repente é possível para ela sentir tudo aquilo sozinha. Ela se levanta da cama e vai até o guarda-roupas do casal. Na gaveta de Batista, retira uma cueca do homem. Ela lembra da noite em que Batista usou aquela mesma cueca para fodê-la. Solta um suspiro de prazer ao lembrar daquilo. A mulher volta para a cama e se deita. Sente uma força descomunal que atrai a sua mão a tocar dentro da sua calcinha, na tentativa de conter a pulsação que ela sente ali. Lentamente, ela fecha os olhos e toca. Sente sua genitália molhada e quente, e retira a mão de lá rapidamente, mas lembra o quanto o toque foi bom. Suspira, tomando coragem, e leva a mão à vagina novamente, fazendo movimentos e explorando áreas que nem mesmo Batista havia sabido explorar. As imaginações com o marido se tornam cada vez mais reais, porém o que ela imagina é um Batista diferente, que saiba satisfazer todos os seus desejos. Flashes do imaginário de Helena: Batista entrando de repente pela porta do quarto e avançando sobre a cama, falando coisas românticas em seu ouvido e lhe prometendo a melhor noite da vida. O homem desce com o corpo, lambendo-a até a vagina. Voltamos ao normal, com Helena de olhos fechados, fazendo os movimentos manuais na vagina por dentro da calcinha. Alterna entre massagens externas e penetrar-se com os dedos dentro da vulva. Ela, delirando de prazer, sozinha. Close de cima na cena, vamos nos afastando. A cena vai escurecendo…
CENA 06: (Comunidade. Ruas. Exterior. Noite.)
• A cena clareia e vemos as ruas escuras da comunidade do Cantagalo, iluminadas apenas por postes que funcionam com dificuldade. Tal qual um filme de terror, Rico vem se aproximando. Anda pela rua cambaleando, muito machucado. Se escora nas paredes para conseguir se manter de pé. Mesmo com dor, ele mantém uma expressão de ódio ardilosa na sua face, um desejo iminente de vingança. Do lado oposto da rua, Maria Joana vem correndo desesperada em direção a Rico. Quando alcança o homem, ele perde as forças e cai sob o corpo de Maria Joana, que lhe segura e apoia.
MARIA JOANA (Chorando/Desesperada): Rico, por favor, me fala o que aconteceu com você! Por que você tá assim, nesse estado?!
RICO (Fraco): Foi a chefona da família Veiga lá… ela mandou uns caras invadir minha casa. Eles me bateram pra me matar, Jô… mas não conseguiram, não.
MARIA JOANA (Chorando): Se você morresse eu nunca ia me perdoar, Rico! Mas, por favor, meu amor, agora que você já sabe e já viu que essa família é perigosa, sai desse meio! A sua vida é mais importante do que tudo isso…
RICO (Ódio): Não mesmo… ter me deixado vivo vai ser o pior arrependimento da Mauricéa, você vai ver!
MARIA JOANA (Chorando/Furiosa): RICO, PARA! PARA COM ESSA MERDA! ESSE DINHEIRO NEM CHEGOU NAS SUAS MÃOS E JÁ TE MUDOU POR COMPLETO… Você não é mais o homem que eu conheço… por favor, Rico… desiste disso, deve ter uma solução melhor pra sua situação!
RICO: Você não entende… eu preciso mudar a minha vida e a vida da minha família, Jô.
MARIA JOANA: A que custo?! VOCÊ VAI MORRER SE CONTINUAR ASSIM!
RICO (Rindo/Fraco): Não pense assim, minha rainha… você sabe que eu sempre dou um jeito em tudo, e não vai ser diferente dessa vez! Ainda mais agora, que eu tô com mais sangue nos olhos do que nunca pra colocar as mãos nessa herança.
MARIA JOANA (Chorando): Por favor, Rico, não… eu não posso te perder, não agora…
• Rico acaricia o rosto dela, sorrindo. Ela desaba em choro sobre ele. Aos poucos, a imagem vai escurecendo.
• Ao som de “Pecado Capital - Só Pra Contrariar”, um novo dia começa na capital carioca. O sol nascendo atrás do Cristo Redentor é mostrado.
CENA 07: (Mansão dos Veiga. Sala de Refeições. Interior. Dia.)
• Mauricéa e Alaor frente a frente à mesa, tomando café da manhã juntos.
MAURICÉA: Dormiu bem, meu amor?
ALAOR: Nem tanto… O clima aqui em casa tá pesado, Mauricéa, desde a leitura do testamento.
MAURICÉA: Eu já sabia que o Ricardo seria um problema… Um homem sem classe, sem preparo, mas tudo bem, isso já vai ser resolvido de uma vez por todas.
ALAOR: Ele é só um motorista, não sabe onde tá se metendo.
MAURICÉA: Justamente por isso que gente ignorante é perigosa, Alaor, eles fazem besteiras achando que estão vencendo o mundo. Mas pode ficar tranquilo, o Rico não vai mais perturbar essa casa nunca mais.
• Alaor a observa desconfortável, como se soubesse que há algo mais por trás daquilo que ela falou. Antes que ele possa dizer alguma coisa, um mordomo surge à porta.
MORDOMO: Com licença, senhores… tem um homem na porta. Ele disse que quer falar com a senhora, dona Mauricéa, pessoalmente.
• Mauricéa se levanta da mesa, intrigada.
MAURICÉA: Um homem? E desde quando eu recebo visita sem hora marcada?
MORDOMO: Ele não quis se identificar. Era um homem forte, alto, tava bem machucado…
• Mauricéa liga os pontos e se apavora ao perceber.
MAURICÉA: Machucado?
MAURICÉA (Furiosa): EU NÃO ACREDITO! De novo essa peste voltando pra me atormentar! Deixa ele entrar, Patrício, que eu quero ver até onde vai a audácia desse infeliz!
• O mordomo se retira e, de repente, ouvimos o som da porta se abrindo. Rico entra, aparece na entrada da sala. Ele anda cambaleando, ainda machucado; o estado dele assusta a todos.
ALAOR (Assustado): Ricardo?!
RICO (Sarcástico): Não esperavam me ver de pé, né?
• Mauricéa encara ele com desprezo.
MAURICÉA: Ora, ora, se não é o bastardinho… (Rindo): Que surpresa mais desagradável, hein, garoto.
RICO: É, surpresa mesmo, hein, Mauricéa? Porque quem mandou aqueles covardes pra me pegar, achou que eu ia morrer…
MAURICÉA: Eu? Querido, assim você até me ofende. Eu não perco meu tempo com gente insignificante.
• Rico se ofende profundamente com o comentário, se exaltando.
RICO (Furioso): TU É UMA SONSA, SUA DESGRAÇADA!
• Alaor tenta intervir.
ALAOR: Calma, rapaz. Essa aqui é uma casa de respeito!
RICO (Indignado): De respeito?! Vocês vivem de jogo, de trapaça… e acham que enganam quem?
MAURICÉA: Você é que não sabe com quem tá lidando, Ricardo.
RICO: Sei sim! Tô lidando com uma perua ricaça metida a dona do mundo, mas que na verdade não passa de uma ridícula! Mas eu não sou mais só o motorista que esquenta a cabeça no sol todo dia pra ganhar míseros reais, não. Eu sou um dos Veiga de Oliveira também!
• Mauricéa respira fundo e dá um passo à frente, encarando Rico cara a cara.
MAURICÉA (Gélida): Você pode até ter o sangue, mas nunca vai ter o nome.
• Rico se aproxima ainda mais, o rosto a poucos centímetros do dela. Eles, rivais.
RICO: O sangue eu já provei, agora quero o resto do que é meu!
• Mauricéa se afasta, passando a mão pelos cabelos, impaciente.
MAURICÉA (Contida): Vem comigo, vamos conversar no escritório, chega de escândalo aqui!
• Mauricéa sobe as escadas para ir até o escritório e Rico a segue, desconfiado. Alaor observa, temendo o que pode acontecer dali pra frente.
CENA 08: (Mansão dos Veiga. Escritório. Interior. Dia.)
• Mauricéa e Rico entram. Mauricéa se senta e faz sinal para que Rico faça o mesmo.
MAURICÉA: Sente-se, Ricardo.
RICO (Desconfiado): Prefiro ficar de pé.
MAURICÉA (Desdém): Como quiser, mas já aviso que essa postura de protagonista vingativo e marrento não vai te servir aqui dentro, querido.
• Rico engole seco. Mauricéa ajeita a postura na mesa e faz uma expressão de tranquilidade ao olhar para ele.
MAURICÉA (Serena): Eu não sou mulher de rodeios, então vou direto ao ponto, Ricardo: Sim, fui eu. Fui eu quem tentou te matar duas vezes, uma naquele hospital e a outra quando eu mandei invadirem o muquifo onde você mora.
RICO (Gélido): Isso não é uma surpresa pra mim, Mauricéa. Eu sei bem que você é capaz disso, principalmente quando se fala em dinheiro.
MAURICÉA: Você não sabe até onde eu posso ir, querido. Eu não tenho limite. Mas, bom… ao que parece, o destino gosta de te ver vivo, não é?
• Rico avança até Mauricéa, jogando tudo o que há na mesa do escritório no chão. Fica bem próximo a ela, furioso.
RICO: VOCÊ É DOENTE!
MAURICÉA (Rindo): Não, querido, eu sou prática. Porque veja bem: você apareceu do nada, herdando tudo o que a minha família construiu em anos, tudo que eu mantive em ordem por anos. Era natural que eu quisesse resolver o problema da forma mais eficiente possível, não acha?
RICO: Problema?! EU TENHO O SANGUE DA SUA FAMÍLIA TAMBÉM, CARALHO!
MAURICÉA: Justamente, e talvez por isso que você ainda esteja respirando, porque essa família é difícil de morrer, vou te contar…
• Um silêncio ensurdecedor se instaura. Rico, incrédulo com as falas de Mauricéa, e a mulher, com serenidade na face.
MAURICÉA: Me dá uma licencinha, Ricardo. Eu já volto.
CENA 09: (Mansão dos Veiga. Suíte Mauricéa. Interior. Dia.)
• Mauricéa adentra o quarto com brutalidade, batendo a porta. Pelas costas de todos, agora ela pode se mostrar vulnerável, chorando. Se sente derrotada.
MAURICÉA (Chorando): INFERNO, inferno… Que merda eu vou fazer agora?!
• Desgovernada, ela anda até o seu enorme guarda-roupas e abre a sua parte. Empurra as suas milhares de roupas e revela-se que, atrás delas, se esconde um cofre. Mauricéa digita a senha deste e o abre. Retira uma pequena caixa de dentro dele e abre-a também. É revelado um revólver branco perolado. Mauricéa o pega entre as mãos com frieza, mas, de repente, uma memória vem à sua cabeça.
FLASHBACK - ON
BATISTA: Mas vem cá, fala mais desse sangue novo na família aí.
MAURICÉA: Você sabe que eu nunca deixei ninguém nessa família passar por cima de mim, às vezes eles podem ficar ao meu lado, chegar perto de mim, mas nunca acima. Batista, eu mandei matar a minha irmã, o meu cunhado, o meu sobrinho… (Rindo): Você acha que o Ricardo é o quê pra mim?
BATISTA: Falando nisso, o Ricardo é filho de quem, hein?
Aquela pergunta soa como um tiro para Mauricéa, deixando-a claramente desconcertada. Ela gagueja para falar.
MAURICÉA (Nervosa): Ué… ele é… filho dos mesmos pais do Marcinho! Mas isso não importa agora.
FLASHBACK - OFF
• Uma lágrima escorre dos olhos de Mauricéa, que larga a arma e a guarda novamente. Ela respira fundo e se recompõe.
MAURICÉA (Chorando): Merda! Eu não tô me reconhecendo mais… eu deveria ser forte o suficiente pra fazer isso…
• Ela limpa as lágrimas, guarda o cofre e se retira do quarto.
CENA 10: (Mansão dos Veiga. Escritório. Interior. Dia.)
• Mauricéa adentra o escritório de surpresa e Rico toma um susto. A mulher visivelmente mais recomposta.
MAURICÉA: Você provou que não vai desistir tão fácil disso, Ricardo. Parece que você tem o mesmo veneno correndo nas veias que corre nas minhas.
RICO: Não me compare a você!
MAURICÉA: Enfim, o que eu estava falando é que, por isso, eu decidi parar de lutar contra você.
RICO: O que tu quer dizer com isso?
MAURICÉA: Eu quero dizer, Ricardo, que a partir de agora você tem um lugar nessa família, oficialmente.
• Rico a encara, incrédulo.
RICO (Rindo): É sério isso? Ontem eu era um alvo, hoje eu sou um Veiga de Oliveira? Você decidiu isso assim, de repente?!
MAURICÉA: Ontem você era uma ameaça, hoje você é uma ferramenta.
RICO: Ferramenta?
MAURICÉA: É. É importante ter gente persistente como você do lado, gente que não tem medo de morrer, e você provou que é assim. O jogo do bicho é uma guerra, Ricardo, e uma guerra se vence com quem sabe sujar as mãos. Você tem coragem, tem sangue quente e, agora, tem nome. Isso tudo te torna bastante útil. Mas não se engane, querido… Aqui não existe honra, nem justiça, é tudo só sobre poder e sobrevivência.
• A câmera se aproxima de Rico, cujos olhos brilham de empolgação. Ele sorri, triunfante.
RICO (Sorrindo): Eu tô pronto pra isso!
MAURICÉA (Séria): Não, não está. Você ainda acha que esse jogo é sobre dinheiro, quando na verdade ele é sobre controle, sobre temor. Quem manda, manda porque o outro teme. Você está disposto a ser temido, Ricardo?
• Rico pensa por um instante e já levanta a cabeça, determinado.
RICO (Gélido): Se for o preço pra não ser pisado, sim, eu tô.
• Mauricéa sorri, satisfeita com a resposta dele.
MAURICÉA: Então vai aprender rápido! Mas escuta bem o que eu vou te dizer: aqui dentro, não existe segunda chance. Se você cair, ninguém vai te estender a mão, nem eu. Eu vou estar te observando, Ricardo. Cada passo, cada movimento e, se você errar, eu mesma acabo o que comecei!
RICO: E se eu vencer?
MAURICÉA (Rindo): Aí, quem sabe, você me surpreenda.
• Mauricéa se afasta e vai até uma mesinha de whisky no canto do escritório, serve dois copos e entrega um para Rico.
MAURICÉA: O jogo começou pra você. Seja bem-vindo à família Veiga de Oliveira.
• Rico a encara, com triunfo no olhar, e Mauricéa o encara de volta, com imponência. Tal qual príncipe e rainha, eles brindam e sorriem um para o outro.
CENA 11: (Mansão dos Veiga. Sala de Refeições. Interior. Dia.)
• Alaor sentado no sofá, tenso, lendo um livro, só esperando o desenrolar da conversa entre Rico e Mauricéa no andar de cima. Quando começa a escutar passos descendo da escada, fecha o livro e começa a prestar atenção. Rico e Mauricéa descem da escada.
MAURICÉA: Alaor, esse é o Ricardo, você já conhece, mas agora pode chamá-lo de…
RICO: Rico! Rico Jacarézinho… pode me chamar assim a partir de agora.
• Alaor força um sorriso.
ALAOR (Sorrindo): Prazer… Rico.
MAURICÉA: Agora ele pertence oficialmente à família, é um dos nossos. O Rico vai cuidar de toda a parte representativa da família, tal qual o Marcinho. Ele é o novo rosto dos Veiga de Oliveira.
ALAOR: Fico feliz que se sinta pronto pra isso, Rico.
RICO: Eu me sinto, seu Alaor. Pode ter certeza…
ALAOR (Rindo): Apenas Alaor, por favor.
MAURICÉA: Meu amor, você pode convocar os funcionários da casa pra que eu possa apresentar o novo… patrão deles, por favor?
• Alaor faz que sim com a cabeça e se retira. Rico sorri.
RICO (Eufórico): Patrão? Caralho!
MAURICÉA: Pois é, querido. Todos os funcionários vão te servir com maestria aqui.
• Alaor volta trazendo uma tropa de funcionários da casa com ele.
MAURICÉA: Bom dia a todos, primeiramente. Eu pedi a reunião de todos aqui para que vocês sejam apresentados ao novo integrante da família e, consequentemente, ao novo patrão de vocês: este é o Ricardo, mas ele prefere que o chamem de… Rico Jacarézinho.
RICO (Sorrindo): É um prazer estar aqui, e é uma grande felicidade ser da família. Podem ter certeza de que vocês vão ser tratados com muito respeito aqui! (Rindo): E espero que vocês consigam me aturar, pelo menos.
• Todos sorriem e o aplaudem, parecem gostar do novo patrão. Rico sorri de volta, se sentindo um rei.
ALAOR: E então, homem, já sabe como o Rico Jacarézinho vai estrear pra esse Rio de Janeiro todinho ver?
RICO (Sorrindo/Enigmático): Ah, quanto a isso… eu já tenho algo em mente, sim.
CENA 12: (Mansão dos Veiga. Suíte Presidencial. Interior. Dia.)
• Rico e Mauricéa adentram o quarto, o antigo quarto de Marcinho, agora sem os pertences do falecido. Rico olha ao redor, impressionado com o luxo do seu novo quarto.
MAURICÉA: Aqui está o seu novo quarto.
RICO (Admirado): Bonito, hein… É o antigo quarto do Marcinho, né? Nem parece.
MAURICÉA: Mandei redecorar, o Marcinho já pertence ao passado agora. Pode reformar o que quiser aqui, tá bem?
• Ela se aproxima da janela, abrindo as cortinas. A luz do sol invade o quarto, iluminando tudo ali.
MAURICÉA: Ricardo, digamos que eu fiz uma rápida pesquisa sobre a sua vida. Morador do Cantagalo, hein? Favelinha difícil, não?
RICO: Mais respeito, por favor. Aquele é o lugar que me fez quem eu sou. Lá não tem luxo, mas tem gente de bem, gente honesta que queima a cabeça no sol todo dia pra fazer um dinheiro muito suado.
MAURICÉA (Rindo): Ah, é? Toma cuidado, hein… gente “honesta” não costuma durar muito nesse tipo de vida que você vai levar agora.
RICO: Nem todo mundo nasce com um sobrenome forte como o nosso, Mauricéa. Uns têm que fazer o nome valer na marra!
MAURICÉA: Pois é esse “na marra” que me preocupa, querido. Agora você carrega o peso de ser parte da nossa família. Eu não sei se você entendeu direito aonde eu tô querendo chegar com isso, mas a principal meta agora é clara: conquistar a área do Cantagalo. Você não tem noção do lucro que aquele lugar traria, é perfeito pra implantar os nossos pontos.
• Rico para um pouco, pensativo.
RICO: O Cantagalo é meu território, Mauricéa, eu cresci lá, e se é pra expandir, eu sei com quem falar!
MAURICÉA: E quem seria?
RICO: Gente grande, sabe? Os líderes de lá…
MAURICÉA (Rindo): Os traficantes, você quis dizer?
RICO: Chame como quiser. No final das contas, eles é que mandam lá dentro. Bom, só tô te provando que se o jogo precisa ser jogado, eu jogo.
MAURICÉA: Você tem ideia do que tá dizendo? A linha entre o jogo e o crime é fina demais, e quando se cruza, é poderosíssima, dá dinheiro pra um caralho. Mas o problema é só um: uma parceria dessa monta não tem volta. Você tem certeza de que pode andar com esses criminosos sem se sujar?
RICO: Eu não me sujo, Mauricéa, eu me adapto. Um jacaré se adapta a qualquer lugar que lhe favoreça, já leu sobre isso? Olha, eu só peço que não se preocupe, Mauricéa. Eu aprendo rápido, e eu não sou como os outros que a senhora tenta moldar.
MAURICÉA: Ninguém é, até perceberem que as cordas estão todas nas minhas mãos.
• Eles se encaram, os dois com uma mania de grandeza inestimável. Nesse momento, a porta se abre e um funcionário entra.
FUNCIONÁRIO: Com licença, senhores… Ah, senhor Rico, chegaram algumas encomendas para o senhor lá no gramado.
RICO: Obrigado, cara. Daqui a pouco eu vou lá conferir.
• Mauricéa encara Rico, desconfiada.
MAURICÉA: O que você tá aprontando?
RICO (Rindo): Coisa minha, já já eu te explico.
FUNCIONÁRIO: Ah, senhores, e tem mais uma coisa…
MAURICÉA: O que é agora, querido?
• O funcionário desdobra um jornal de dentro do bolso, Mauricéa o pega e abre; Rico se junta para ver e os dois se surpreendem ao olhar o que está estampado logo na primeira página: uma foto de Rico, estampado como o novo integrante da família Veiga de Oliveira.
FUNCIONÁRIO: A notícia já tá correndo solta. Todos os jornais e canais estão falando: “Ricardo Veiga de Oliveira assume o jogo do bicho no Rio.”
• Mauricéa fecha os olhos por um instante, respirando fundo. O funcionário sai, deixando um silêncio desconfortável entre eles.
MAURICÉA (Furiosa): Você não perde tempo mesmo, né?!
RICO (Sarcástico): A senhora mesma disse que o nome pesa. Eu só ajudei o mundo a saber quem carrega ele agora. Seguinte, não fica bolada, não, até porque isso de eu ser famoso no Rio vai contribuir muito pro que eu pretendo fazer ainda hoje…
MAURICÉA (Impaciente): Tudo bem, eu não vou dizer nada. Mas você ainda vai entender o que significa estar aqui dentro, Rico. E eu espero, sinceramente, que você sobreviva o suficiente pra poder contar história depois.
RICO: Pode deixar. Eu não morro fácil, dona Mauricéa, e você sabe disso. Agora dá licença porque eu tenho uma missãozinha pra realizar na comunidade do Cantagalo, é hora do Brasil conhecer o Rico Jacarézinho. #Start no game, babe!
• Rico se retira, dançando empolgado. Mauricéa observa o trajeto dele, com desdém.
• Ao som de “Jacaré no Samba - Patrulha do Samba”, vamos acompanhando o passar das horas no Rio de Janeiro. Close aéreo na comunidade do Cantagalo.
CENA 13: (Casa de Rico. Cozinha. Interior. Tarde.)
• Kelly, Cátia e Paulão se ajudam nas tarefas de casa enquanto conversam.
KELLY (Angustiada): Ô gente, e cadê o Ricardo, hein? Ele saiu ontem e não apareceu até agora…
CÁTIA: Nem me fale, minha filha. Eu tô com muito medo de onde o Ricardo tá se metendo, e o meu coração de mãe me diz que é algo muito perigoso!
PAULÃO: Mas, infelizmente, não dá pra controlar o que ele faz ou deixa de fazer, né? O Ricardo já é um rapaz crescido, já trabalha, traz sustento pra dentro de casa.
CÁTIA: E isso tudo é muito bom, mas deixa de ser a partir do momento que a nossa vida é colocada em risco. Ou você acha que eu não me pergunto até agora o porquê daqueles homens terem invadido essa casa ontem?
KELLY: Exatamente. Eu não sei nem mais o que pensar, eu só queria ter o meu irmão de volta, o///
• A fala de Kelly é cortada por um som estridente que vem se aproximando. Ao fundo, podemos ouvir “Jacaré no Samba - Patrulha do Samba” e uma voz de narrador fazendo um anúncio. Kelly, Cátia e Paulão correm para o lado de fora para ver o que está acontecendo.
CENA 14: (Comunidade. Ruas. Exterior. Tarde.)
• Close aéreo na comunidade do Cantagalo. Vemos um carro alegórico verde e enorme, confeccionado com um jacaré enorme em cima e estourando confetes brilhantes, que chama a atenção de toda a comunidade. Todos os moradores nas portas de suas casas, curiosos com o que está acontecendo. Atrás do enorme carro alegórico, uma tropa de carros de jornais e imprensa segue-o, filmando tudo. Nos aproximamos, vendo tudo aquilo de frente. Os olhos do jacaré brilham em cima do carro alegórico. Podemos ver também que no carro há milhares de sacos de brinquedos. Nos aproximamos da parte mais alta do carro, e revela-se Rico lá em cima, acenando para todos, com um sorriso triunfante no rosto. Vestido com roupas chiques de grife, dourado e verde-escuro, relógios e óculos escuros de ouro puro. Usa também um colarinho de jacaré. Um narrador começa a falar no microfone e os moradores da comunidade podem escutar tudo pelas enormes caixas de som acopladas ao carro alegórico.
NARRADOR: Rico Jacarézinho, gravem este nome! O novo ricaço do pedaço já se mostra ser um cara muito bacana e está executando, na comunidade do Cantagalo, uma doação de brinquedos para as criancinhas. Há milhares de bonecas para as meninas e bolas de futebol para os meninos! Senhor Rico, você gostaria de dar uma palavrinha?
• Rico pega o microfone, se sentindo um rei.
RICO (Sorrindo/Eufórico): VIVA O JACARÉZINHO, CANTAGALO!
• Uma boa parte dos moradores vibra com a novidade, principalmente as crianças. Outros ficam chocados. Os traficantes locais encaram Rico, intrigados, estranhando, mal-encarados, prontos para tirarem satisfação com ele. Foco nas famílias de Rico e de Maria Joana lado a lado, todos incrédulos. Foco em Maria Joana, perplexa, encarando a cena.
MARIA JOANA (Incrédula): … Rico Jacarézinho?!
• Zoom em Rico, glorioso, acenando para todos. Sorriso de orelha a orelha. O novo malandro do jogo do bicho está no pedaço.
(FIM DO EPISÓDIO)
10/11/2025
©️ GS Literatura.
